Sabe o que me pertence? O meu corpo.
Falo do corpo mesmo. Cabeça, braços, torso, pernas, mãos. Conheço cada pinta nova, cada ruga, cada mancha.
Antes eu só olhava meu rosto. Meus olhos contavam o que me ia na alma, no espírito.Tempo de perguntas, tempo de surpresas, tempo de urgências. Isso bem antes, na juventude.
Depois com a vida exigindo mais e mais passei a dar valor às minhas pernas, elas eram fortes e me levavam aonde eu tinha que ir. E ia mesmo, para o trabalho, à escola, à casa da minha mãe. O transporte público não era interligado, então andava-se muitas quadras até chegar ao ponto do ônibus. E ter pés e pernas fortes foi fundamental.
Passado esse período, veio este tempo. De não correr mais atrás de nada, de aquietar-se, pois chegou o tempo da fragilidade, da observação, da constatação.
Aí vejo o envelhecimento chegando aos poucos em meu corpo todo. Uma manchinha aqui, outra ali. Uma dor crônica , um desgaste de coluna ou algo do tipo. Mas é o meu corpo. Pelo qual tenho carinho e cuidado. Olho meus braços e minhas mãos. Que hoje mais do que nunca cumprem um papel importante. Me afagam, quando estou doente, escrevem quando quero libertar minhas ideias, meu pensar. Então instintivamente as cuido, as olho, as vejo. Olho para minhas mãos, como um dia olhei para os meus olhos. Cada qual em sua época cumprem a mesma função. Expor o que me vai na alma! Hoje são minhas mãos, com as quais exerço meu ofício da escrita quem mais merece meu carinho e cuidado.
Sabe o que de fato me pertence? Meu corpo!

