Morro. Só pode ser ela aqui neste quarto. Sinto seu hálito gelado e, em vez de frio, meu corpo derrete-se em suor. Tenho febre. É uma sensação estranha, um tremor interno… A morte está aqui, à espreita, eu sinto.
Tatiana já esteve aqui… olhou-me. Como é triste quando nos olham assim meio de longe, não querendo se aproximar.
Meu suor escorreu dos meus carapinhos brancos e desceu sobre meus olhos. E ela ali nessa proximidade distanciada, não querendo se comprometer. Deve achar que chorei. Há tempos não choro mais.
Não sei qual o ocorrido para seus cabelos ficarem verdes; nas pernas eram meias, eu sei, e os olhos também estavam cheios de tinta verde. Mas até o cabelo?
De todo modo, ela veio. Olhou-me do alto, estava de salto. Não sei se queria me ver bem ou morto.
Na incerteza e na inutilidade própria, saiu.
Passaram-se os minutos, ouvi a rua se enchendo, o vaivém das pessoas. O que está acontecendo? Que dia será hoje?
Lembrei! É carnaval! É isso! Por isso ela estava verde. Hoje é o Baile Verde!
Não! Ela não vai ao baile de carnaval e me deixar aqui morrendo. Ou vai?
Talvez mande a Lu aqui.
Ela sempre se aproveita por ser a patroa e manda a empregada fazer o “serviço sujo”.
E o fato de eu morrer no dia do Baile Verde só pode ser sujeira, ela deve achar.
O relógio do corredor bate; as horas passam, o barulho da rua aumenta. O que estará fazendo Tatiana? Morro… Sei disso…estou nesta cama há meses, estive na cama do hospital outro tanto… nunca me senti assim.
Num escuro amedrontador, pegajoso, vou e volto…Nem Tatiana, nem Lu. Não saíram ainda. Não ouvi os passos descendo as escadas. O barulho da rua aumentou. Devem estar arrumando as fantasias. Isso! Estão arrumando as fantasias. Logo uma delas ou as duas vêm me ver. Fecho os olhos. Um cansaço me abate…”Ó jardineira, por que estás tão triste?”… agora mesmo ela vem me ver.
Ela não vai me deixar morrer sem que eu veja como deve estar linda com sua fantasia do Baile Verde. Ela vai fazer questão de me mostrar.
A minha filha Tatiana